Conta-se que duas irmãs de Maria, mãe
de Jeusus, teriam tomado um barco para escapar de possíveis represálias após a
morte do Apóstolo. Assim, Maria Jacobina, Maria Salomé, essa mãe dos apóstolos
Tiago e João, junto com Maria Madalena, Marta, Lázaro, José de Arimatéia e
Maximínio, e com eles uma serva de nome Sara, teriam sido jogados ao mar sem
remos e nem provisões, numa pequena embarcação, quando descobertas as suas
identidades ligadas a
Apóstolo dos gentios. Sara, que próxima
de Jeus e cristã fervorosa, teria rezado e rogado a Deus, prometendo que se chegassem a salvo em algum lugar ela passaria o resto
de seus dias com a cabeça coberta por um lenço. Logo o grupo chega em terra
firme na cidade de Saintes-Maries de la Mer, localizada hoje na região de
Camargue, no Sul da França.
Ao desembarcarem foram recebidos por ciganos habitantes do local que,
estranharam a cor da pele de Sara, que leva o epíteto Kali, quer dizer Negra.
Há quem diga que Sara Kali teria sido serva e parteira auxiliar de Maria. Ela
então adota o “diklô”, um lenço sobre a cabeça e logo se torna parteira das
ciganas e as ajuda a encomendar e ter filhos. Essa história vai passando para a
frente, até hoje. Bom, as tias de Jesus, Maria Salomé e Maria Jacobina ficam em
Saintes-Maries para difundir as palavras do Mestre e Sara também, como serva
das senhoras. O restante do grupo deixa a cidade.
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Muitas centenas de anos depois criou-se o mito sobre Sara Kali entre os
ciganos e logo ela se tornaria a padroeira desse povo, adorada, venerada,
respeitada e na igreja de Saintes-Maries muitas crianças ciganas são batizadas.
Dos quatro cantos do mundo, ciganos e outros não ciganos, invadem a pequena
cidade de Saintes-Maries de La Mer na semana de 24 e 25 de maio para venerar
Sara a padroeira, e Jacobina e Salomé. Na verdade, o Vaticano elevou as tias de
Jesus primeiro à categoria de Santas Marias Salomé e Jacobina, daí a cidade
onde aportaram se chamar em francês, Saintes-Maries. A canonização de Sara veio
depois, consta que em 1712 e o dia 24 de maio é a festa dedicada a ela, e o dia
25 é para às tias.
Durante aproximadamente uma semana, uma multidão de ciganos se instala
pelos hotéis, casas e ruas da cidade para as devidas homenagens a Sara e às
Marias. Saintes-Maries se torna a capital dos ciganos, com a sua alegria, a sua
música, dança, e união familiar. Vestidos a caráter, homens, mulheres,
crianças, jovens, idosos, grupos de músicos, artistas famosos, como o cigano
Ricao, campeão de vendas de cds, alegram as pequenas ruas de Saintes-Maries. Ao
logo da praia, carroças, carros, moto homes de ciganos se instalam, e à noite em
torno de muita comida e músicas se reúnem.
A IGREJA
Na cripta da Igreja de Saint Michel,
fica uma imagem de Santa Sara Kali, diariamente coberta por lenços e mais
lenços, entregues pelos seus devotos por graças alcançadas ou simplesmente para
lhe render homenagem. Santa Sara é protetora da maternidade. Mulheres ciganas
que não conseguem engravidar, ou que pedem um bom parto, depositam os seus
“diklôs”. Sara é ainda conhecida como a santa dos desesperados, dos ofendidos e
dos desamparados.
Na manhã do dia 24, após a celebração
de uma missa na igreja de Saint Michel, a imagem de Santa Sara deixa a cripta
em procissão pelas ruas da cidade em direção ao mar, para o mesmo lugar onde
chegou a centenas e centenas de anos. Membros de uma das tradicionais famílias
de ciganos, são encarregados de levar o andor tendo à frente cavaleiros
montados em belos cavalos. O bispo de Arles e padres vão puxando a procissão,
enquanto grupos de músicos ciganos tocam e cantam; ciganos e não ciganos
vestidos a caráter caminham. Na praia uma outra multidão aguarda o cortejo que
vai à loucura quando a imagem da Santa entra no mar. Uma confusão se forma, mas
nada de problemas e a imagem de Sara retorna à cripta para mais um ano de
adoração até à próxima procissão. Ah,
cabe à igreja de Saint Michel ser a guardiã das centenas de milhares de lenços,
os “diklôs”, deixados sobre a Santa.
Santa Sara tem adoradores
pelo mundo afora, e no Brasil também. É fácil encontrar brasileiras nos hotéis,
na igreja e nas ruas de Saintes-Maries.
Texto e fotos de Carminha Corrëa Jecko
(Reportagem publicada na Revista Class)